Museu El Greco por Rosângela Vig

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Rosângela Vig é Artista Plástica e Professora de História da Arte.

Louva as coisas belas, recebe-as alegremente no espírito, para fazer delas o seu alimento, e torna-se assim nobre e bom (…) acolhe-a com ternura e reconhece-a como um parente, tanto melhor quanto mais tiver sido preparado para isso pela educação. (PLATÃO, 2004, p. 95)

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A Grécia Antiga encantou com seu legado no campo da Mitologia, com seus Deuses; nos domínios da Literatura com os poemas épicos Ilíada e Odisséia; e no âmbito da Filosofia, com pensadores, entre os quais, Platão (428 – 347 a.C.). Para o filósofo da Antiguidade Grega, o Belo estava na natureza, que deveria ser considerada como modelo em simetria, proporção e cores. Tal ajuizamento deixava evidente impressão de seu enlevo acerca do mundo ao redor. Para o pensador, o Belo que nos causa tanto encantamento; que remete ao simples e ao verdadeiro, estaria ligado a uma representação do mundo das idéias e até mesmo a um sentido educativo. Esse conceito de beleza ficou impresso na Arte da Grécia Antiga, na forma de Arquitetura, de Escultura e de Pintura.

Empreendendo uma jornada pelo tempo, a partir da Antiguidade, chega-se ao Maneirismo, estilo que permeou como uma transição entre o Renascimento e o Barroco, e teve como o maior representante, um artista natural da Grécia. Doménikos Theotokópoulos (1541 – 1614), mais conhecido como El Greco, nasceu no local onde atualmente fica o Museu El Greco 1, 2 (Figuras 2, 3 e 4) na cidade de Fodele 3, em Creta. Do lado oposto do museu está a Capela Bizantina Agia Panagia 4, do século XI, onde El Greco deve ter entrado em contato com a Arte pela primeira vez. De acordo com historiadores, foi o próprio pintor que, em 1606, afirmou que o local onde nascera era rodeado de fontes de água potável, de laranjeiras e de uma igreja Bizantina.

Localizado a um quilômetro do centro da cidade, o museu abriga documentos (Fig. 6), cópias de obras associadas ao artista (Figuras 7, 8 e 9) e réplicas de suas pinturas. O visitante ainda pode conhecer informações sobre sua vida na Grécia e o cômodo que pode ter sido seu ateliê de pintura (Figuras 13, 14 e 15). Em ruínas, a construção foi restaurada em 1982, pelo Ministério da Cultura da Grécia e abriu ao púbico em 1998. Atualmente o local é aberto a visitações e palco de eventos artísticos e exposições.

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Sobre o artista

Eu pinto porque os espíritos sussurram loucamente dentro de minha cabeça. (El Greco in NICI, 2015, p. 120)

A Arte ousada e brilhante de El Greco percorreu séculos e reverberou nos dias atuais. Seu estilo único e inconfundível o tornou o principal representante do Maneirismo e serviu de inspiração a artistas modernos como Picasso (1881 – 1973). Pode ser que um discreto tom de vozes tenha segredado ao pé do ouvido dos grandes pintores desafiando-lhes a mente ao descrever retratos celestiais ou umbráticos.

E é bem provável que tais sussurros teçam uma pequena cena, um minúsculo fragmento ou apenas um provável elemento do espaço divino que somente a alma livre consegue abraçar. As mãos habilidosas conduzem o utensílio que leva os tons e as feições ao que antes era apenas um murmúrio em segredo. Sobre a tela alva, as pinceladas vigorosas deslizam e as cores desbravam o branco espaço, feito uma semente germinando, como a natureza se construindo, com raízes e folhas se disseminando. Extenuado, o artista observa o painel e confere se está de acordo com o murmúrio que ouviu inicialmente.

É bem possível que seja esse o processo de quem cria a Arte, em suas diversas formas de manifestação. Assim foi a El Greco. Sua frase que inicia esse texto pode ser a mesma de muitos e de muitas que convertem os sussurros que um dia ouviram em imagens ou em cenas. E o espetáculo que emerge de início rumorejante, depois aflora estrondoso e ecoa pela História, fazendo escarcéu e arrastando consigo estilos, cenas, nomes e pensamentos.

A personalidade controversa do artista se aproximava muito de seu estilo de pintura que não seguia os padrões nem tampouco os pintores de sua época, figurando entre o final do Renascimento e anterior ao Barroco, mas nem por isso se inserindo em algum desses modelos.

Nascido de uma próspera família, El Greco estudou na Escola de Artes de Creta e se especializou em Arte Bizantina; estudou também a História da Grécia; foi pintor, arquiteto e escultor. A cidade de Candia, como era chamada antigamente, o local onde nasceu, era famosa por seus artistas e Escolas de Arte, o que levou El Greco a se interessar e seguir a carreira. Alguns historiadores acreditam que aos vinte e poucos anos o artista já trabalhava em seu próprio ateliê.

Aos 26 anos El Greco se mudou para Veneza e trabalhou no ateliê de Ticiano (1490 – 1576), como seu aluno. Em 1570 mudou-se para Roma onde encontrou mais artistas e novas inspirações para seu trabalho e, embora não seguisse padrões convencionais, El Greco deixava à mostra certa influência dos estilos de Tintoretto (1518 – 1594) e Ticiano. Devido às críticas que fez a vários artistas em Roma, entre os quais Michelangelo (1475 – 1574), El Greco acabou por ganhar inimigos. A fase mais importante da carreira do artista foi a partir de 1577, quando chegou à Espanha e conheceu Diego de Castilla (1510 – 1584), que o orientou a ir a Toledo para fazer pinturas na Igreja de Santo Domingo el Antiquo, que o tornaram famoso na cidade. Não muito tempo depois, o Rei Filipe II (1527 – 1598) encomendou do artista duas pinturas para a corte. El Greco se tornou muito conhecido por volta dos anos 1580 até o final do século e o artista mais procurado para pintar igrejas e locais religiosos conhecidos. Após um período de dificuldades devidas ao não pagamento de suas obras, conseguiu viver confortavelmente pintando e estudando até o final de sua vida, aos 72 anos.

É decerto por esta razão (…) que a educação musical é a parte principal da educação, porque o ritmo e a harmonia tem o grande poder de penetrar na alma e tocá-la fortemente, levando com eles a graça e cortejando-a, quando se foi bem educado. E também porque o jovem a quem é dada como convém sente muito vivamente a imperfeição (PLATÃO, 2004, p. 95)

Apaixonado por música, El Greco deu emprego a muitos músicos por anos, para tocarem para ele. Fruto de seu relacionamento com Doña Jeronima de Las Cuevas, com quem não há confirmação se foi casado, seu único filho, Jorge Manuel também se tornou um pintor.

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O legado

É preciso servir-nos dos ornamentos do céu como exemplos no estudo dessas coisas invisíveis, como fariamos se encontrássemos desenhos feitos com habilidade incomparável por Dédalo ou por qualquer outro artsta ou pintor; ao vê-los, um geômetra consideraria que são verdadeiras obras-primas (…) (PLATÃO, 2004, p. 243)

As obras de Platão são inesgotáveis fontes de estudo e de pesquisa. Suas palavras acima se acomodam perfeitamente em uma análise da Arte maneirista e, em especial, no estilo de El Greco. Na busca por mudanças e liberdade, os artistas aplicaram a teatralidade e o movimento às pinturas, principais marcas do Maneirismo. El Greco se destacou nesse campo, reverberando sua Arte extraordinária pela História, com inconfundíveis traços.

Seus seres são alongados e se contorcem em meio a paisagens umbráticas e desoladoras, como se invocassem o Céu em súplica (Fig. 11). Muitas vezes a única luz de suas cenas emana de seus personagens, como seu Cristo (Fig. 12) em seu lento gesto de abençoar. Muitas vezes é impossível perceber a procedência da iluminação, como se ela fosse proveniente do Céu.

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Mais que escutar as vozes que lhe sussurravam ao ouvido, El Greco ouviu as vozes de sua época e a angústia que a Europa vivia ainda em meio à Inquisição e reverberou esse eco em sua Arte, na forma de inquietação e de assombro, permitindo à posteridade que experimentasse tais sensações por meio da cor e da forma.

1 Link para vídeo do museu El Greco
www.youtube.com/watch?v=yLblLpxLt5Q

2 Link para vídeo do museu El Greco
www.youtube.com/watch?v=U-HZ6-U3zAI

3 Link para vídeo da cidade de Fodele
www.youtube.com/watch?v=wMfJMKcPIJo

4 Link para vídeo da Capela Bizantina Agia Panagia em Fodele
www.youtube.com/watch?v=KtGpu1w4HaE

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Referências:

  1. BAUDELAIRE, Charles. As Flores do Mal. São Paulo: Editora Martin Claret, 2006. Tradução de Pietro Nassetti.
  2. BAYER, Raymond. História da Estética. Lisboa: Editorial Estampa, 1993. Tradução de José Saramago.
  3. CHILVERS, Ian; ZACZEK, Iain; WELTON, Jude; BUGLER, Caroline; MACK, Lorrie. História Ilustrada da Arte. Publifolha, S.Paulo, 2014.
  4. FARTHING, Stephen. Tudo Sobre a Arte. Rio de Janeiro: Sextante, 2011.
  5. GOMBRICH, E.H. A História da Arte. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1988.
  6. HAUSER, Arnold.História Social da Arte e da Literatura. Martins Fontes, São Paulo, 2003.
  7. NICI, John B. Famous Works of Art. Maryland USA: The Rowman &Littlefield Publishing Group, 2015.
  8. PLATÃO. A República. São Paulo: Editora Nova Cultura, 2004.

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