Desenho – Movimento, Passo a passo 4 de como desenhar por Rosângela Vig

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Você também pode ouvir esse artigo na voz da própria Artista Plástica Rosângela Vig:

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Rosângela Vig é Artista Plástica e Professora de História da Arte.

Desenrola-se a sombra no regaço
Da morna tarde, no esmaiado anil;
Dorme no ofego do calor febril,
A natureza mole de cansaço.
Vagarosas estrelas! Passo a passo,
O aprisco desertando, às mil e às mil,
Vindes do ignoto seio do redil
Num compacto rebanho, e encheis o espaço…
(BILAC, 1997, p.65)

Passo a passo 4 de como desenhar

É possível divagar pelas palavras de Olavo Bilac e imaginar as estrelas movendo com o cair da noite, chegando, uma a uma, ao firmamento azul, em uma marcha preguiçosa, como a tarde mole de verão. Com a descrição do poeta, o anoitecer ganha relevância e a cena ganha vida. Assim é a Poesia, assim é a Arte. E o Movimento está entre os atributos que levam vida a uma obra.

Leonardo Da Vinci (2007, p.54) estava correto ao afirmar que “um bom pintor tem dois principais objetos para pintar: o homem e a intenção de sua alma; o primeiro é fácil, o segundo é mais difícil, pois ele tem que representá-lo pelas atitudes e movimentos dos membros.” Embora a perfeição estética tenha chegado a um auge no Renascimento, nas obras finais de Michelangelo e de Rafael, a dramaticidade levou ainda mais beleza às obras e trouxe para a História da Arte, o Maneirismo. E o movimento exacerbado, a principal característica desse estilo, levou dinamismo às obras.

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As mãos e os braços em todas suas ações devem exibir a intenção da mente que os move, até quanto for possível, porque, por meio deles, quem tiver um bom julgamento mostrará intenções mentais em todos seus movimentos. (DA VINCI, 2007, p.58)

Há efeitos que promovem a ideia de ação a uma cena estática, entre os quais, a expressão facial; a posição dos corpos das pessoas e as roupas esvoaçantes. É como se um acontecimento, em seu apogeu, tivesse sido congelado no tempo. O dinamismo é pois, uma característica da maravilhosa obra de Poteiro (Fig. 1), onde a ciranda ocorre em tempo real, enquanto os anjos abençoam com flores, que voejam em meio às crianças.

Fig. 1 – Ciranda, Óleo sobre tela, Antônio Poteiro.
Fig. 1 – Ciranda, Óleo sobre tela, Antônio Poteiro.

Na figura 2, toda a euforia da dança ficou evidenciada harmoniosamente por Izabel Pariz, por meio das poses das pessoas e das saias rodando. A ação é reforçada pelas ondulações dos tecidos, e pelas sombras que o movimento proporciona. Todos os personagens parecem estar num mesmo ritmo, e quase se pode ouvir a música.

Na obra de Rita Caruzzo (Fig. 3), não há tecidos esvoaçantes, mas o arco-iris, cujas cores se movimentam e rodopiam ao redor do corpo da mulher, que parece se mover num gesto demorado, longo, numa cena surreal.

Fig. 3 – O Desabrochar das Horas, Óleo sobre tela, Rita Caruzzo.
Fig. 3 – O Desabrochar das Horas, Óleo sobre tela, Rita Caruzzo.

O exagero da perspectiva é a característica da obra de Paulo Byron (Fig. 4), caráter que enaltece a sensação de movimento. Como a parte superior do tronco do sambista e seu instrumento musical estão em tamanho maior que a parte inferior, a sensação é a de que ele está dançando, batucando e jogando seu corpo para a frente, na direção de quem vê. A impressão que fica é a de que o homem está tocando ao pé de nosso ouvido e se aproximando, cada vez mais. E o som do batuque permanece no inconsciente e vai aumentando com a proximidade. Dependendo de como as figuras se posicionam na imagem, de seu ângulo, de sua proporção e de sua perspectiva, a imagem pode levar à impressão de se mover.

Fig. 4 – Sambista, Acrílico sobre tela, Paulo Byron.
Fig. 4 – Sambista, Acrílico sobre tela, Paulo Byron.

O movimento também está nos objetos e nas coisas que fazem parte de uma cena. Ao ritmo do vento, as bandeiras (Fig. 5) também parecem dançar, agitadas, com ondulações em seus tecidos. Suas cores, dependendo da posição e do efeito da luz do sol sobre elas, também são alteradas e ficam com diferentes tonalidades de azul, de branco e de vermelho.

Fig. 5 – Bandeiras ao vento, Foto de Rosângela Vig.
Fig. 5 – Bandeiras ao vento, Foto de Rosângela Vig.

Em cenas com água, como é o caso da figura 6, o lago quase não tem movimento e reflete a imagem da superfície, de cabeça para baixo. Percebe se repetirem, o azul do céu, as árvores e os prédios, cujos detalhes não se pode precisar, porque a água é limpa e parte do fundo do lago se mistura à imagem. Como as ondulações da água são mínimas, quase nada se altera na imagem refletida.

Fig. 6 – Cidade espelhada em lago, água parada, Foto de Rosângela Vig.
Fig. 6 – Cidade espelhada em lago, água parada, Foto de Rosângela Vig.

A figura 7, por sua vez, apresenta um córrego, cujo movimento constante está direcionado para o ponto de fuga, que fica do lado direito da cena. Percebe-se esse movimento pelas ondas que se formam para aquela direção. Nas ondas, há reflexos do céu, na cor branca, porque o dia está nublado. Parte do fundo do rio, as pedras e a vegetação podem ser vistos, uma vez que a água é muito limpa.

Fig. 7 – Córrego, água em movimento, Foto de Rosângela Vig.
Fig. 7 – Córrego, água em movimento, Foto de Rosângela Vig.

Na sossegada Marina de Carlos Helmut Japp (Fig. 8), a tranquilidade parece ter se refletido na água, que tem pouco movimento. Há curtas e pequenas ondas, que parecem ser o resultado de uma leve brisa.

Tal calmaria não ocorre com o navio da figura 9, uma vez que o mar está revolto, em virtude de uma forte tempestade. As nuvens no céu, confirmam o violento temporal que agita a água. As ondas se agigantam erguendo o navio, o que acentua a sensação de assombro.

Fig. 9 – Navio em meio a tempestade, Pastel oleoso sobre papel craquelado, Rosângela Vig.
Fig. 9 – Navio em meio a tempestade, Pastel oleoso sobre papel craquelado, Rosângela Vig.

No abstracionismo de Clovis Loureiro, belíssimos seres fantásticos emergem e parecem saltar da tela. Na imagem (Fig. 10), o movimento fica por conta de seus formatos sinuosos e flexíveis, de suas longas asas onduladas que parecem se sobrepor umas às outras; e de seu colorido exótico e harmônico, sobre o fundo preto.

O movimento finaliza e leva alma a uma obra. Os Mestres da Pintura conheciam bem esses segredos! E a Arte é um capricho do artista, que contempla a vida com um olhar observador e diferenciado; que se embriaga com o simples e dele extrai um propósito, uma intenção. Ao transpor isso para a obra, ele carrega de vida, uma cena inerte; e faz uma brincadeira com os sentidos. O resultado, a quem vê, só poderia ser o maravilhamento.

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Referências:

  1. BILAC, Olavo. Antologia Poética. Porto alegre, RS: L & PM Editores, 1997.
  2. DA VINCI, Leonardo. Grandes Mestres da Pintura. Folha de São Paulo. S. Paulo, 2007.
  3. KANDINSKY. Olhar sobre o Passado. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1991.
  4. MORAES, Vinícius. Livro de Sonetos. São Paulo: Companhia das Letras, 1991.
  5. MEIRELES, Cecília. Espectros. São Paulo: Ed. Global, 2013.
  6. QUINTANA, Mário. Quintana de bolso. Porto Alegre: Ed. L & PM, 2004.
  7. VAN GOGH, Vincent. Grandes Mestres da Pintura, Folha de São Paulo, S. Paulo, 2007.

As figuras:

Fig. 1 – Ciranda, Óleo sobre tela, Antônio Poteiro.

Fig. 2 – Africanos IX, Óleo sobre tela, Izabel Pariz.

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Fig. 3 – O Desabrochar das Horas, Óleo sobre tela, Rita Caruzzo.

Fig. 4 – Sambista, Acrílico sobre tela, Paulo Byron.

Fig. 5 – Bandeiras ao vento, Foto de Rosângela Vig.

Fig. 6 – Cidade espelhada em lago, água parada, Foto de Rosângela Vig.

Fig. 7 – Córrego, água em movimento, Foto de Rosângela Vig.

Fig. 8 – Marina, Barcos, Nanquim sobre papel, Carlos Helmut Japp.

Fig. 9 – Navio em meio a tempestade, Pastel oleoso sobre papel craquelado, Rosângela Vig.

Fig. 10 – Magnífico, Óleo sobre tela, Clovis Loureiro.

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