Você também pode ouvir esse artigo na voz da própria Artista Plástica Rosângela Vig:
Sonhar é acordar-se para dentro;
De súbito me vejo em pleno sonho
E no jogo em que todo me concentro
Mais uma carta sobre a mesa ponho.
(QUINTANA, 2004, p.73)
Passo a passo 5 de como desenhar
A Poesia de Mário Quintana (1919-1994) é encantadora, sensível e sugere um passeio pelo interior da alma. Assim deve ser o fazer artístico e talvez seja esse o maior propósito da Arte Abstrata. Ao abstrair, o artista faz contato com as emoções, sonha, dialoga com sentimentos e evoca a subjetividade, para que ela estenda seus largos braços. Foi esse o principal pensamento de Kandinsky, o precursor desse estilo, ao se desvencilhar da figuração, em suas obras, e afirmava,
Eu tinha o sentimento cada vez mais claro, de que na Arte, as coisas não dependem do “formal”, mas de um desejo interior (=conteúdo) que delimita o domínio do formal. Foi um grande passo à frente (…) resolver inteiramente o problema da Arte com base na necessidade interior, que estava em condições de subverter a cada instante o conjunto das regras e das fronteiras conhecidas. (KANDINSKY, 1991, p.93)
Apaixonado pelas cores e pela Música, Kandinsky permitiu que esses dois elementos permeassem sua Arte e que por meio deles, a obra transcendesse, tivesse um sentido mais profundo, ligado às sensações que pudesse provocar na alma, capaz de estimular as emoções. Sua Arte espiritualizada 1 e Sublime desvencilhava-se porém, do objeto, desprendia-se do mundo real, para ampliar o campo de visão, ao aproximar alma e sentidos. Seu estilo fala ao espírito, pelo espírito e do espírito; e permite que a Pintura se permeie de Poesia, pronunciando-se pelas cores e pelas formas. A Arte Abstrata trilha ainda pelos caminhos da liberdade estética, em sua aproximação com o interior. Para Schiller (1759-1805) (2002, p.21), “a Arte é filha da liberdade e quer ser legislada pelas leis do espírito, não pela privação da matéria”. Tal liberdade possibilita que o artista se desvencilhe do rigor da forma, que seu criar seja desimpedido e que ele siga seus impulsos e suas impressões, tão essenciais na abstração. E por esse percurso, as imagens vão então, surgindo, relatando texturas, articulando sons e declamando uma poesia calada.
O fazer abstrato passa pelos domínios da cor, na obra de Jorge Calfo 2 (Fig. 1). Suas matizes se sobrepõem, intercalam-se e se permeiam em ondulações, como a brincar sobre o fundo azul claro, que confere luz a seu trabalho. Na figura 2, o artista se permite ousar e leva para a pintura, o amarelo, o azul, o vermelho e o verde, que se associam e se transformam em novos tons. Em seus movimentos soltos, as cores estão entregues à liberdade que a elas é consentida, pelas mãos do artista. Na figura 3, as cores frias estão mais presentes, mas nem por isso a obra se torna melancólica, nem lhe falta luz, porque o fundo amarelo ilumina a composição. As cores primárias resolveram brincar, mas não se misturaram, e o resultado foi a obra da imagem 4. Iluminada pelo fundo claro, ainda se juntou para a brincadeira, o preto, que trouxe profundidade à composição. E a tessitura é interminável na floresta de cores, da imagem 5, onde as linhas brancas se sobressaem, em meio ao fundo iluminado e ao amarelo, em sua tentativa árdua de abrir caminho e invadir o espaço. Nas obras do artista, o uso racional de profundidade, de cor e de jogos de luz e de sombra, permitem ao espectador a percepção do que está à frente ou ao fundo. A luz, a sombra e o movimento são aqui trabalhados de forma coerente e lógica.
Não é difícil de se encantar, ao divagar pelas obras da artista Elena Bissinger. Na figura 6, o amarelo e o azul parecem se mover num círculo constante, em duas grandes ondas que rodopiam para um mesmo ponto de fuga. De seus respingos, emerge o verde, como o resultado da mistura do azul e do amarelo; e afloram o branco e o preto, que levam ao conjunto, a ideia de profundidade e de proximidade. Na figura 7, as cores parecem se chocar, no alto do firmamento, numa dança sobre o fundo azul. Os vermelhos, os amarelos e os azuis se sobrepõem e se desfazem, permitindo às outras cores, que também participem do alegre bailado. O oceano azul, da imagem 8, está em pleno movimento e parece acolher o branco e o preto, num carinhoso gesto. Num abraço gentil, o azul leva para suas profundezas, as cores que abrigou, revolvendo-as para si. Em todas as obras, estão presentes as cores, o movimento e a sensação de profundidade.
A subjetividade parece não ter fim, quando o artista trabalha livremente. Mas seu jogo entretanto adquire um propósito racional e objetivo, quando as linhas, as formas e as cores se intercalam. É nesse ponto que a obra Abstrata se torna robusta e tem sentido. Quando os elementos do desenho como a perspectiva, a luz, a sombra e o movimento se associam ao criar, a Pintura se completa. A composição artística parece então, se divertir sobre o fundo imaginário, quando o artista perambula livremente pelas formas, e as deixa soltas, gozando da liberdade que lhe aprouver. É nesse ponto que a Pintura se embriaga de Poesia. Há que se arrancar da alma as emoções mais profundas; descortinar seu véu, deixando à mostra, os sonhos, as visões, os pensamentos. É necessário à alma se metamorfosear e se materializar por meio de linhas que se sobrepõem; por meio de cores brincalhonas; por meio de formas que se intercalam, perfazendo sombras umas sobre as outras e permitindo que a luz transpasse pelos entremeios. O fazer artístico se consolida na autonomia do espírito, age com justeza sobre a forma, e imprime na obra reflexões e anseios, nada é aleatório.
Vale a pena elevar ainda mais o pensamento e se deixar levar por mais essas palavras de Kandinsky
Durante anos procurei a possibilidade de conduzir o espectador a “passear” dentro do quadro, de força-lo a fundir-se no quadro, esquecendo a si mesmo.
(KANDINSKY, 1991, p.87)
Vídeo de como produzir um Abstrato por Jorge Calfo:
Sem segredosComo não cultivo segredos, transparência é meu forte, vai ai cinco minutos de produção, para matar a curiosidade de alguns…rsrsrs”Rio de matizes que escorrem dos sonhos até aos pelos do pincel, desaguando em quantidades mil por entre as tramas do papel, que as recolhe e se deixa marcar por esse encontro mágico!” 30/07/2015
Posted by Jorge Calfo on Quinta, 30 de julho de 2015
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E quando a inspiração se refugiar em seu interior, permita que ela se acomode da melhor forma, no papel em branco, na tela ávida por cores; vale deixá-la divisar emoções, ajeitar-se livremente e se desdobrar em Poesia pintada, em Música colorida. E ficam para a inspiração mais dois lindos poemas,
Escrevo diante da janela aberta.
Minha caneta é cor das venezianas:
Verde! … E que leves, lindas filigranas
Desenha o sol na página deserta!
Não sei que paisagista doidivanas
Mistura os tons… acerta… desacerta…
Sempre em busca de nova descoberta.
Vai colorindo as horas quotidianas…
Jogos da luz dançando na folhagem!
(QUINTANA, 2004, p.7)Pinta-me a curva desses céus… Agora,
Ereta, ao fundo, a cordilheira apruma:
Pinta as nuvens de fogo de uma em uma,
E alto, entre as nuvens, o raiar da aurora.
(BILAC, 1997, p.43)
Vídeo de Linhas Abstratas por Jorge Calfo:
Fio a fio eles vão misturando-se uns aos outros, mesclando-se, como se fosse linhas de um tricô. Pouco a pouco, matiz a matiz vai sendo construído diante dos olhos, um tecido outrora existente apenas na imaginação. Do imaginário ao real, unindo, entremeando, mesclando…COSTURANDO MATIZES – a SÉRIE! Bom dia!
Posted by Jorge Calfo on Quarta, 14 de janeiro de 2015
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1 Kandinsky reuniu suas reflexões sobre a Arte Moderna, em seu livro Do Espiritual na Arte, de 1912.
2 Videos de Jorge Calfo
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Artigos sobre a História da Arte da Rosângela Vig:
Referências:
- BILAC, Olavo. Antologia Poética. Porto alegre, RS: L & PM Editores, 1997.
- FARTHING, Stephen. Tudo Sobre a Arte. Rio de Janeiro: Sextante, 2011.
- QUINTANA, Mário. Quintana de bolso. Porto Alegre: Ed. L & PM, 2004.
- KANDINSKY, Wassily. Olhar Sobre o Passado. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1991.
- SCHILLER, Friedrich. A Educação Estética do Homem. São Paulo: Ed. Iluminuras, 2002.
As figuras:
Fig. 1 – “Hoje a cor me pegou” 13, têmpera e pigmentos sobre papel Canson, gramatura 300 g/m², Jorge Calfo.
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Fig. 2 – “Hoje a cor me pegou” 06, têmpera sobre papel Canson, gramatura 300 g/m², 21 x 29 cm, Jorge Calfo.
Fig. 3 – “Hoje a cor me pegou” 07, têmpera sobre papel Canson, gramatura 300 g/m², 21 x 29 cm, Jorge Calfo.
Fig. 4 – “Hoje a cor me pegou” 10, têmpera sobre papel Canson, gramatura 300 g/m², 21 x 29 cm, Jorge Calfo.
Fig. 5 – Sem título, têmpera sobre papel Montval, gramatura 300 g/m², 29 x 21 cm, set/2015, Jorge Calfo.
Fig. 6 – Povestea Unui Val (A História de uma onda), Elena Bissinger.
Fig. 7 – Nascut Printre Stele (Dançando com golfinhos), Elena Bissinger.
Fig. 8 – Infinitele Lubiri (O amor infinito), Elena Bissinger.
ROSÂNGELA VIG
Sorocaba – São Paulo
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Desenho e Pintura – O Abstrato, Passo a passo 5 de como desenhar por Rosângela Vig http://t.co/uld59viBS0
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