A Arte de Jean-Michel Basquiat durante o ano de 2018 no Brasil por Rosângela Vig

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Você também pode ouvir esse artigo na voz da própria Artista Plástica Rosângela Vig:

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Rosângela Vig é Artista Plástica e Professora de História da Arte.

A realidade da consciência, esta faculdade sobre que as pessoas tanto tagarelam e de que são tão orgulhosas, é um sinal de nosso imperfeito desenvolvimento. Antes que nos tornemos superiores deve fundir-se no instinto. (WILDE,1994, p.113)

Wilde nos fala da liberdade do espírito. A liberdade que a Arte traduziu em seus códigos, em sua mais pura forma de se apresentar, mais próxima do pensamento, desprendida da realidade e da figuração. Essa tendência se manifestou de forma acentuada na Arte Moderna e foi o que habitou as obras de Jean-Michel Basquiat (1960-1988) 1, um dos artistas mais populares dos anos 80. Seu pano de fundo foi a cidade; a cor foi a protagonista em muitas de suas obras; e a forma foi livre. O modo como Basquiat via o mundo ficou registrado em prédios abandonados de Manhattan. Mas sua Arte atravessou as barreiras do urbano, serviu de inspiração a vários artistas, passou por galerias e tem alto valor em leilões.

Basquiat se tornou conhecido como grafiteiro, em Nova Iorque, cidade onde nasceu e morreu. De ascendência materna portorriquenha e paterna, haitiana, o artista foi o primeiro filho da família de classe média alta. Sua inteligência, seu talento e interesse pela Arte eram visíveis desde cedo. Com pouca idade, Basquiat reproduzia desenhos com maestria e, aos seis anos, era freqüentador do MOMA, Museu de Arte Moderna. Devido a um grave acidente aos sete anos, foi internado e, para manter o filho ocupado, a mãe lhe deu o livro Gray’s Anatomy. Isso, de certa forma, o levou a estudar a anatomia humana e influenciou suas pinturas. Como uma alusão ao livro, o artista chegou a fundar em 1979, a banda Gray’s, que envolvia movimentos como o Hip Hop e o Rap.

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Três anos de sua adolescência, Basquiat viveu em Porto Rico, devido à separação dos pais e retornou a Nova Iorque aos 17 anos. Não se adaptou às escolas por onde passou, abandonou os estudos e foi morar com amigos. Pintava e vendia camisetas nas ruas da cidade, onde passara a viver. Os prédios abandonados de Manhattan, seus primeiros grafites, com o amigo Al Diaz, recebiam a assinatura SAMO (abreviação de Same Old Shit), que significava “sempre a mesma merda”. Esses grafites se ampliaram para paredes e para o metrô de Nova Iorque. Basquiat passou a ser conhecido na cidade, foi convidado para um programa de televisão e para um filme.

Seu estilo primitivista e neo-expressionista chamou a atenção da crítica. Em 1980 participou da exposição The Times Square Show. No ano seguinte, o crítico Rene Ricard (1946-2014) publicou um artigo comentando sobre o artista, o que levou Basquiat a ser conhecido e a expor internacionalmente e em Nova Iorque, ao lado de nomes como Keith Haring (1958-1990) e Barbara Kruger (1945-). Passou a ser prestigiado por grandes curadores de Arte e a se relacionar com conhecidos artistas do movimento neo-expressionista. Teve um relacionamento com a ainda desconhecida cantora Madonna (1958-), além de uma grande amizade com Andy Warhol (1928-1987) 2, que muito o ajudou inclusive com moradia, divulgação e material de trabalho. Chegou a declarar nos grafites, SAMO morreu, quando deixou a Arte de rua e passou a pintar telas. Seu trabalho adquiriu projeção meteórica e a amizade com Warhol coincidiu com o período mais criativo da vida do artista. Expôs em museus de Nova Iorque e em vários países, mas a morte do amigo, em 1987 atuou negativamente em sua produção. Basquiat não atendia mais as exigências da crítica e deixava de ser uma celebridade. A solidão e o uso excessivo de drogas o levaram à morte em 1988. A vida curta do artista se transformou em um filme de 1996, que teve David Bowie, no papel de Andy Warhol e Jeffrey Wright como Basquiat.

O urbano e a expressividade são as mais fortes marcas das obras de Basquiat. O uso de palavras e de letras em suas pinturas revela sua ligação com o grafite de rua e com a variedade de assuntos e de livros lidos por ele, entre os quais, o Gray’s Anatomy de sua infância. Diferentemente da Pop Art do amigo Warhol, a Arte de Basquiat criticava de forma contundente o sistema, o poder, os conflitos de classe e o racismo, não obstante a presença de policiais em suas obras. É possível encontrar também figuras de profetas, atletas, guerreiros, mitos, músicos (Fig. 4) e heróis (Fig. 1).

Na figura 1, o herói se apresenta em duas posições, de frente, num plano mais próximo; e de lado, num plano mais afastado, sugerindo velocidade. Do lado esquerdo da pintura, ele está em pleno movimento, com uma das pernas para trás, o que acentua a idéia de movimento. A outra perna, para frente, sugere um passo largo, tem o joelho, a panturrilha e a coxa delineados, revelando que o artista conhecia noções de Anatomia. A alusão ao icônico personagem dos quadrinhos fica por conta do traje vermelho, do cinturão com o raio desenhado e da máscara. Ao redor, a cidade tem prédios, com portas e janelas.

O artista trouxe à tona as questões sociais e raciais, usando o negro como protagonista, em muitas de suas pinturas. O próprio artista, por ser negro, conseguiu êxito em um universo que na época era predominantemente de brancos. A convulsão de formas é expressiva, visceral, junta-se ao incontido desejo de expor o lado mais contundente da sociedade, o urbano decadente e avesso, com o qual ele próprio conviveu. O primitivismo deixa clara a ligação com o grafite e com o fato de que, à Arte, cabe papel de expor o pensamento, não de registrar a realidade. De sua carreira, ficaram obras que atualmente são disputadas no mundo da Arte.

A realidade e a imagem
O arranha-céu sobe no ar puro lavado pela chuva

E desce refletido na poça de lama do pátio,
Entre a realidade e a imagem, no chão seco que as separa,
Quatro pombas passeiam.
(BANDEIRA, 2008, p.118)

Sobre a Exposição

Neste ano, uma grande retrospectiva da obra de Jean-Michel Basquiat vai circular pelo Brasil, com entrada gratuita para o público. Com mais de 80 peças, entre quadros, desenhos, gravuras e pratos pintados, a incrível coleção com inúmeras obras-primas do artista poderá ser conhecida no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em São Paulo, em 25 de janeiro, aniversário da cidade. As obras ficarão em exposição na capital paulista até 7 de abril para, em seguida, serem apresentadas em Brasília (de 21 de abril, aniversário da capital federal, a 1º de julho), Belo Horizonte (16 de julho a 26 de setembro) e Rio de Janeiro (12 de outubro a 8 de janeiro de 2019). A vinda desse acervo tão qualificado ao Brasil, em quatro capitais, levou cerca de dois anos de negociações.

A retrospectiva Jean-Michel Basquiat foi concebida com obras da família Mugrabi, dona das maiores coleções de Basquiat e também de Andy Warhol. As peças foram disputadas por diversos países, entre eles Coreia do Sul, Japão e Rússia. A incrível coleção chega ao país graças à ação conjunta do Banco do Brasil e da produtora Art Unlimited, com patrocínio da BB SEGURIDADE, da BRASILCAP e do GRUPO SEGURADOR BANCO DO BRASIL E MAPFRE. A curadoria é de Pieter Tjabbes. “A iniciativa de apresentar a maior retrospectiva do trabalho de Basquiat na América Latina, em quatro capitais brasileiras, ao longo de um ano, com ingressos gratuitos, reforça o compromisso do Banco do Brasil na formação do público para as artes visuais, no acesso à cultura e no valor da diversidade”, afirma Alexandre Alves de Souza, diretor de Marketing do Banco do Brasil. Empresa que concentra os negócios de seguros, previdência, capitalização e planos odontológicos do Banco do Brasil, a BB SEGURIDADE também reforça que “o patrocínio à exposição fortalece seu posicionamento de companhia fomentadora da democratização da cultura no País”, como explica seu diretor, Sergio Augusto Kurovski. “O patrocínio é uma forma de oferecer à sociedade a experiência de acessar obras tão importantes nos Centros Culturais Banco do Brasil”.

1 Website – Biografia:
www.basquiat.com/artist.htm

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2 Relação de Andy Warhol e Jean-Michel Basquiat – Philos TV:
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Referências:

  1. BANDEIRA, Manuel. Bandeira de Bolso. Porto Alegre: L&PM Pocket, 2008.
  2. FARTHING, Stephen. Tudo sobre Arte. Rio de Janeiro: Editora Sextante, 2011.
  3. RINK, Anita. Graffiti: Intervenção Urbana e Arte. Curitiba: Editora e Livraria Appris, 2015.
  4. WILDE, Oscar. A Decadência da Mentira e outros Ensaios. Rio de Janeiro: Imago Editora Ltda., 1994.

As figuras:

Fig. 1 – Flash em Nápoles | 1983 | Acrílico e tinta a óleo em bastão sobre tela | 168 x 153 cm | © The Estate of Jean-Michel Basquiat. Licensed by Artestar, New York.

Fig. 2 – Sem título | 1983 | Acrílico e tinta a óleo em bastão sobre tela | 244 x 181 cm | © The Estate of Jean-Michel Basquiat. Licensed by Artestar, New York.

Fig. 3 – A linguiça do irmão | 1983 | Acrílico, tinta a óleo em bastão e colagem de papel sobre tela | 122 x 476 cm | © The Estate of Jean-Michel Basquiat. Licensed by Artestar, New York.

Fig. 4 – Jean-Michel Basquiat, John Lurie, 1982 tinta a óleo em bastão sobre papel, 168,6 x 76,5 cm. © The Estate of Jean-Michel Basquiat. Licensed by Artestar, New York.

Fig. 5 – Jean-Michel Basquiat, Sem Título (Alcatrão Amarelo e Penas), 1982, tinta acrílica, bastão, lápis de cera, colagem e penas em painéis de madeira, 245,11 x 229,24 cm. © The Estate of Jean-Michel Basquiat. Licensed by Artestar, New York.

Fig. 6 – Jean-Michel Basquiat, Sem Título (Bracco di Ferro), 1983, Acrílico e bastão a óleo sobre tela com suportes de madeira, 182,9 × 182,9 cm. © The Estate of Jean-Michel Basquiat. Licensed by Artestar, New York.

Fig. 7 – Jean-Michel Basquiat, Lombo, 1982, acrílico, bastão a óleo colorido e pastel sobre tela, 182,88 x 121,92 cm. © The Estate of Jean-Michel Basquiat. Licensed by Artestar, New York.

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