Embora pareça estranho, a tristeza pode ser motivadora da criatividade. O filósofo e escritor Fabiano de Abreu é defensor de uma curiosa teoria que alega haver um lado positivo do sentimento de tristeza, que seria como um degrau a colaborar com o processo criativo.
É sabido que grandes nomes das artes e da literatura do passado como Goethe, Álvares de Azevedo, Lord Byron, Chateaubriand e Musset, identificados no ultra-romantismo e no chamado “mal do século”, eram conhecidos até hoje por terem suas obras inspiradas pelo pessimismo extremo, em face do passado e do futuro, melancolia difusa, tristeza, culto do mistério, do sonho, da inquietude mórbida e desencanto em face do cotidiano. Logo, a teoria de Fabiano não está tão distante assim de expressar uma realidade comprovável.
O filósofo explica o que pode trazer a criatividade à tona em meio a um sentimento de tristeza: “Alguns de nós sentem nas emoções negativas uma energia poderosa de criação; como se toda a nossa mente fosse muito mais receptiva aos estímulos, muito mais forte a aprofundar sentimentos, muito mais engenhosa. A tristeza desenha-se assim como um terreno fértil para a criatividade. Logo a criatividade na tristeza é uma defesa para sair dela ou um meio para encontrar soluções para esse sentimento. Uma forma de escape da dor, uma autodefesa, um remédio para uma mente que está negativamente abalada”.
No entanto, Fabiano também ressalta que para alguns a tristeza é um estado de espírito desejado, atrelado à própria personalidade: “Por outro lado, e em oposição, existem os que buscam a tristeza de forma propositada. Há quem goste da tristeza, pois nela busca a criatividade para fazer o que gosta. Há indivíduos que se agarram na tristeza, na melancolia ou na nostalgia com uma percepção de que nelas e com elas irão surgir bons pensamentos e ideias. Como se esse sentimento desenvolvesse um foco na tarefa com muito mais profundidade”.
Conceito de tristeza
Fabiano de Abreu detalha o que em sua concepção se define como tristeza e qual o seu lugar no panteão das emoções humanas: “a tristeza está mais relacionada ao interior em oposição aos sentimentos de felicidade ou euforia que extravasam para o exterior. A tristeza é um sentimento maduro no sentido em que não representa uma reação instantânea a um estímulo. É antes um sentimento que se constrói a partir de um ponto e é alimentado com recordações, com memórias, com análise constante das nossas vivências mais negativas, com perdas e sentimentos de impotência”.
Para ele, a tristeza também é uma oportunidade de exercitar o autoconhecimento, pois aponta para a contemplação interior: “a tristeza é interna, é nossa, muito própria. A tristeza provavelmente fará com que nos conheçamos melhor e mais profundamente e por essa razão é o caminho de abertura para o nosso lado mais criativo”.
Tristeza como consequência de um intelecto superior
Baseado em suas observações, o filósofo também ressalta que a tristeza pode surgir como consequência de um intelecto mais desenvolvido, que constata as mazelas da vida cotidiana e a impotência de modificar determinadas situações: “Pessoas com mentes mais criativas podem de certa forma ser mais propensos à tristeza, o que seria o inverso de buscar a tristeza para ser criativo. Intelectos mais desenvolvidos, mais amplos, tendem a criar mais, contudo tendem a ver a realidade em toda a sua plenitude e a perceber como ela é dura. A dureza dessa realidade nos torna mais introspectivos, mais sós. Assim, a tristeza e a criatividade caminham lado a lado, uma alimentando-se da outra”.